sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Parece que foi hoje

Pronunciamento

(Do Sr. Deputado Chico Alencar, PSOL/RJ)

Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados e todo(a)s o(a)s que assistem a esta sessão ou nela trabalham:

Parece que foi hoje. O escritor Luis Fernando Veríssimo, em artigo na revista “Caros Amigos”, ressalta a perpetuação de duas figuras simbólicas no cenário brasileiro: os sem-terra e os sem-vergonha. Detalhe importante: o texto é de outubro de... 2000, em plena ‘era FHC’, há quase uma década. Os sem-terra, espera-se que sejam extintos pela realização da Reforma Agrária. Os sem-vergonha, espera-se que sejam extintos – ou pelo menos tenham sua influência reduzida na política brasileira – pela realização de reformas políticas e eleitorais, que garanta o financiamento público exclusivo de campanha, o fortalecimento dos partidos políticos, que vede a participação nas eleições de candidatos corruptos e que torne o processo eleitoral mais democrático. O Governo Lula, apesar de sua “retórica reformista”, prefere se apequenar nas articulações com a bancada ruralista e com a bancada fisiológica no Congresso, impedindo qualquer avanço democrático.

“Duas Histórias de Sucesso

As duas maiores histórias de sucesso no Brasil de hoje são a do Movimento dos Sem-Terra e a da – como chamá-la? – cultura da mão dupla (uma mão lava a outra, uma mão molha a outra, uma mão jura que não sabia o que a outra estava fazendo) que se desenvolveu à sombra da pseudo-social-democracia em flor no poder, e da qual só nos deixam ter vislumbres a cada investigação de escândalo abordada. Pode parecer cruel comparar os despossuídos do MST com os beneficiários de arranjos, conchavos e lobbies ao contrário de Brasília, mas o MST é, sim, um sucesso e, como os sem-vergonha, também deve seu sucesso a uma forma de pré-absolvição.

Nenhum outro movimento social se organizou e se mobilizou como o dos sem-terra no Brasil recente e, se alguma coisa foi feita em matéria de reforma agrária nestes últimos anos, foi devido à sua pressão. Com os sindicatos acuados pela crise e a oposição esmagada ou enrolada pela ‘base de sustentação’ do governo, o MST conta com a determinação dos que não têm nada a perder e a evidente justiça da sua causa – cujo argumento mais óbvio e indiscutível é a simples existência de uma "causa" fundiária num país deste tamanho – e é hoje a única força de contestação conseqüente à situação. Fora um banho de sangue, que pegaria muito mal lá fora, o governo não tem muitas outras maneiras de lidar com o problema do que já faz, que é ceder aos poucos e protelar o que pode. Já que nem o problema nem o MST irão embora e uma reforma agrária mesmo, como a prometida, parece estar fora da questão.

O sucesso dos espertos impunes em Brasília se deve a uma decisão tácita de que este governo não pode ser perturbado por questões menores, como a ética, quando tantos interesses maiores dependem da sua absolvição, apesar das provas em contrário. Como a justiça da sua briga garante a razão dos sem-terra, a conveniência política da sua impunidade garante o sossego dos sem-vergonhas.

E, no fim, os dois sucessos derivam de dois fracassos. A falta de uma política agrícola e de uma política industrial no caso dos excluídos sublevados e a falta de uma mudança nos hábitos da República, apesar de toda a retórica reformista, no caso dos incluídos corruptos.”

Esse texto “atualíssimo” foi escrito, repito, em pleno governo FHC. A realidade retratada é a mesma do Governo Lula. As bases do atraso da sociedade brasileira permanecem intocadas.

O PSOL tem lutado, junto aos movimentos sociais do campo e da cidade, para que a Reforma Agrária se torne realidade. E realizado todos os esforços para que a democracia brasileira se torne mais republicana. Ontem mesmo, enviamos ao TSE manifesto de solidariedade, que transcrevo, às iniciativas que visam tornar mais transparentes as doações feitas aos candidatos no período eleitoral.

“Nós, parlamentares do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), manifestamos nosso total apoio às iniciativas do Tribunal Superior Eleitoral que visam tornar mais transparentes as doações feitas aos candidatos no período eleitoral.

Compartilhamos desta preocupação com o TSE e em 2009 apresentamos proposição – PL 6186 – tornando obrigatório que os partidos declarem a procedência dos recursos repassados aos candidatos.

O Brasil vive uma crescente “democracia empresarial”, com “eleições de negócios", em que os partidos se tornam, com poucas exceções, ajuntamentos de interesses difusos para fruir das benesses do poder.

Ao eleitor, a quem de direito cabe decidir o resultado das eleições, tem sido negado o direito às informações necessárias para a boa escolha dos seus representantes. As empresas têm utilizado brechas para incidir de forma oculta no processo eleitoral, privilegiado setores políticos com os quais tenham maior afinidade ou interesses em comum. São essas brechas: 1 – as doações feitas aos partidos e repassadas aos candidatos; 2 – doações aos comitês de arrecadação; 3 – doações aos partidos, que utilizam este recurso com gastos rotineiros, economizando dinheiro do Fundo Partidário para ser enviado ao candidato; 4 – doações feitas por associações setoriais, sem que o nome das empresas doadoras seja registrado.

As preocupações do TSE, que esperamos sejam transformadas em resolução, garantirão transparência plena, vinculando cada recurso recebido pelo candidato com a empresa que o doou. Precisamos dar passos importantes na construção de uma democracia republicana. O Brasil necessita de eleições limpas, com discussão de projetos e soluções para os problemas que afligem nossa população, e financiamento austero e visível das campanhas.”


Agradeço a atenção,

Sala das Sessões, 04 de fevereiro de 2010.

Chico Alencar

Deputado Federal, PSOL/RJ

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